Páginas

sexta-feira, 25 de março de 2011

Sobre Emmanuel Levinas

Emmanuel Levinas
(Kaunas30/11/1906 /Paris, 25/12/1995)
Filósofo francês de família judaica na Lituânia.

[... "O 'egoísmo' da ontologia mantém-se mesmo quando, ao denunciar a filosofia socrática como já ouvidador do ser e como já a caminho da noção do 'sujeito' e do domínio técnico, Heidegger encontra, no pré-socratismo, o pensamento como obediência à verdade do ser, ... como toda a história ocidental, concebe a relação com outrem como cumprindo-se no destino dos povos sedentários, possuidores e edificadores de terra. A posse é a forma por excelência sob a qual o Outro se torna o Mesmo, tornando-se meu"....]

Na sua obra Autrement qu’etre (1974) traz a inquietação dos seis milhões de judeus assassinados durante o Holocausto (Shoah), marcado pela dominação do homem sobre o outro homem. Em 30 anos viu duas guerras mundiais, os totalitarismos de direita e esquerda, hitlerismo, stalinismo, Hiroshima, o goulag, genocídios de Auschwitz e do Cambodja. Século que finda estes nomes bárbaros, com sofrimento e mal impostos de maneira deliberada, mas que nenhuma razão limitava na exasperação da razão tornada política e desligada de toda a ética.

Ele fala do pensamento ocidental, que a partir da filosofia grega, desenvolveu-se como discurso de dominação. O Ser dominou a Antigüidade e a Idade Média substituído depois pelo eu da época moderna, até hoje. Sempre sob o mesmo sinal: a unidade unificadora e totalizante que exclui o confronto e a valorização da diversidade, entendida como abertura para o Outro. A obra alerta para uma emergência ética de se repensar a filosofia com um novo olhar em direção ao Outro. Inspiração buscada na sabedoria bíblico-judaica.

Confrontando a filosofia ocidental, dialoga constantemente com os pensadores da tradição, como Platão, Descartes, Kant, Hegel e Bergson. Estão sempre presentes em sua obra, Husserl e Heidegger seja partindo deles, seja já tentando superá-los e afirma: “quase sempre, começo com Husserl ou em Husserl, mas o que digo já não está em Husserl” e, em outro lugar: “Apesar do horror que um dia veio associar-se ao nome de Heidegger — e que nada poderá dissipar — nada conseguiu desfazer em meu espírito a convicção de que Sein und Zeit, de 1927, é imprescritível”.

De Descartes guarda a descoberta da idéia do infinito, tomada como orientação metafísica para a sua ética. Contudo, segundo Levinas é com Franz Rosenzweig que comunga suas maiores intuições, autor esse "presente demais para ser citado".

Autrement qu’etre fala de uma sociedade que alcança nossos dia, onde a competição, falta de solidariedade, constante subjugação e que coloca à margem a maioria de seus integrantes. Uma humanidade egoisticamente ambígua que torce pela paz e pela guerra. Enfoca um Império ancorado no egoísmo, na imposição e no controle do Eu sobre o Outro e do Eu sobre outrem. A partir da Alteridade, coloca a Ética para uma reflexão crítica da Benevolência como uma não superação do egoísmo, na realização do Eu. Onde compreendemos uma específica crítica à sociedade contemporânea.

ALTERIDADE EM LÉVINAS - Egoísmo, a própria e exclusiva subjetividade, que sustenta o pensamento ocidental, característica da "filosofia do poder". O Eu que se basta em si mesmo, uma realidade definitiva que marca o ego como reduto do ser ao ente: o eu-em-mim-mesmo.

O Ser fechado nega a exterioridade, a transcendência, numa mesmicidade ontológica. Para Lévinas a exterioridade, o Infinito da pessoalidade se dá no encontro com outrem e nos faz sair da unidade para a multiplicidade ressaltando a importância do encontro com o Outro, onde determina o acolhimento e conduz para a igualdade.
[... "No acolhimento que é já a minha responsabilidade a seu respeito e em que por conseqüência, ele me aborda a partir de uma dimensão de altura e me domina...” ... “O Rosto de outrem clama e na Alteridade o fechamento rompe e conduz a um novo eu: de um eu-em-si-mesmo, para um eu-com-o-outro, na exterioridade, em uma relação Eu-Outro, na qual não há negação da individualidade do Mesmo, nem tão pouco do Outro; há compartilhamento de convivência, há intersubjetividade...” ..."a relação assimétrica com o Outro, que infinito, abre o tempo, transcende e domina a subjetividade...” ..."o outro passa a ter primazia sobre o mesmo, isto é, sobre o Eu que se fixa na sua identidade e não reconhece nada além de si...” ..."esta se dá de forma concreta, numa história e numa política".]

IMPÉRIO - como um elemento motivado e inerente à centralidade e fechamento do Eu, situa-se como a expressão máxima do egoísmo, onde o ser, motivado e conduzido exclusivamente por uma subjetividade centrada e fechada em si mesmo, impõe-se ou visa se impor sobre outrem.

Esta imposição, para Lévinas, tem sua origem e fundamento desde já na compreensão realizada pelo próprio, pelo Mesmo na ontologia: "a ontologia como filosofia primeira é do poder". O Eu através da ontologia se basta a si mesmo e impor-se frente ao Outro, frente ao mundo e às outras pessoas. Segundo Lévinas: "A mediação fenomenológica serve-se de uma outra via em que o "IMPERIALISMO ONTOLÓGICO" é ainda mais visível. É o ser do ente que é o médium da verdade" que leva à "filosofia do poder, a ontologia, que não põe em questão o Mesmo, é uma filosofia da injustiça".

Refletindo a partir da fenomenologia, mas utilizando-se de uma ótica filosófica singular, ele critica a filosofia ocidental, mostrando ainda que a filosofia de Heidegger sustenta e conduz exatamente a uma conduta de Império, uma vez que "a ontologia heideggeriana que subordina a relação com Outrem à relação com o ser em geral mantém-se na obediência do anônimo e leva fatalmente a um outro poder, à DOMINAÇÃO IMPERIALISTA, à tirania".

O Império, através da ontologia, da filosofia ocidental, expressa a busca pelo domínio e pelo poder, pela submissão do Outro aos interesses e motivações do Eu.