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segunda-feira, 4 de abril de 2011

Sobre Saramago

José de Sousa Saramago (1922/2010)
escritor português galardoado com o
Nobel da Literatura em 1988.




Traduzir
Escrever é traduzir. Sempre o será. Mesmo quando estivermos a utilizar a nossa própria língua. Transportamos o que vemos e o que sentimos (supondo que o ver e o sentir, como em geral os entendemos, sejam algo mais que as palavras com o que nos vem sendo relativamente possível expressar o visto e o sentido…) para um código convencional de signos, a escrita, e deixamos às circunstâncias e aos acasos da comunicação a responsabilidade de fazer chegar à inteligência do leitor, não a integridade da experiência que nos propusemos transmitir (inevitavelmente parcelar em relação à realidade de que se havia alimentado), mas ao menos uma sombra do que no fundo do nosso espírito sabemos ser intraduzível, por exemplo, a emoção pura de um encontro, o deslumbramento de uma descoberta, esse instante fugaz de silêncio anterior à palavra que vai ficar na memória como o resto de um sonho que o tempo não apagará por completo.

O trabalho de quem traduz consistirá, portanto, em passar a outro idioma (em princípio, o seu próprio) aquilo que na obra e no idioma originais já havia sido “tradução”, isto é, uma determinada percepção de uma realidade social, histórica, ideológica e cultural que não é a do tradutor, substanciada, essa percepção, num entramado linguístico e semântico que igualmente não é o seu. O texto original representa unicamente uma das “traduções” possíveis da experiência da realidade do autor, estando o tradutor obrigado a converter o “texto-tradução” em “tradução-texto”, inevitavelmente ambivalente, porquanto, depois de ter começado por captar a experiência da realidade objecto da sua atenção, o tradutor realiza o trabalho maior de transportá-la intacta para o entramado linguístico e semântico da realidade (outra) para que está encarregado de traduzir, respeitando, ao mesmo tempo, o lugar de onde veio e o lugar para onde vai. Para o tradutor, o instante do silêncio anterior à palavra é pois como o limiar de uma passagem “alquímica” em que o que é precisa de se transformar noutra coisa para continuar a ser o que havia sido. O diálogo entre o autor e o tradutor, na relação entre o texto que é e o texto a ser, não é apenas entre duas personalidades particulares que hão-de completar-se, é sobretudo um encontro entre duas culturas colectivas que devem reconhecer-se.” - José Saramago

A questão aqui não é sobre o que Saramago escreve e sim a reação que seus escritos causam às pessoas, no fundo pelo que vimos, muitos tiveram uma reação caimista. Saramago como a maioria dos ateus (caso ele seja um) briga com Deus, então vem a pergunta: como se briga com aquilo que não existe? Seria de fato ateu, os ateus? Tenho minhas dúvidas já que ele deixa bem claro: "Deus não é de fiar", ou “Não sou um ateu total, todos os dias tento encontrar um sinal de Deus, mas infelizmente não o encontro” e ainda “O problema não é um Deus que não existe, mas a religião que O proclama!”

Evidentemente que ele tinha todo direito de expressar sua opinião, bem como permitiu que o outro a tivesse e que impusesse sua verdade como absoluta. Não foram poucos que sentiram agredidos com o livro "O Evangelho Segundo Jesus Cristo", motivo que levou um reporter a perguntar o porque dele falar tanto da Bíblia, respondeu: "Não se ponha na posição da Igreja, de que não se toca na Bíblia”.

Saramago poderia responder simplesmente que gostava de provocar por ter descoberto o 'calcanhar de aquiles' das pessoas. Coisa que ficou claro no lançamento do livro Caim, onde ressuscitaram incompreensões, ódios, ainda acusaram-no de ser herege e de ler a Bíblia com ingenuidade, respondeu: "Abençoada ingenuidade que me permitiu ler o que lá está e não qualquer operação de prestidigitação, dessas em que a exegese é pródiga, forçando as palavras a dizerem apenas o que interessa à igreja. Leio e falo sobre o que leio".

Sobre a conversa com um teólogo, declarou: "A mim, o que me vale, meu caro Tolentino, é que já não há fogueiras em São Domingos". O Papa, após o lançamento de Caim voltou a afirmar publicamente que apenas a Igreja Católica pode interpretar a Bíblia. ( http://is.gd/OKND09 )

Suas declarações:
Deus, Igreja e Bíblia - http://is.gd/BTGequ
Bíblia e Deus - http://is.gd/HzCIQF
Parte I do Jornal da Globo - http://is.gd/rMA4zw
Parte II do Jornal da Globo - http://is.gd/nYZDpl

vídeo relacionado: - http://is.gd/CPX1Ht

Bem! Esta é a opinião de José Saramago, eu posso não concordar com ele, porém todo ser racional sabe que esse direito lhe pertenceu. E outra coisa, quando um ateu critica Deus no fundo ele critica “nada”. É difícil entender isso?

Mas se for diferente, como enaltecer e fortalecer a hipocrisia dos fariseus de plantão? Porque eles amam o outro até o exato momento que o outro discorda da sua opinião e criam um tremendo alvoroço em nome de Deus.

Se meu dógma for bem estruturado dentro dos princípios de uma fé professada posso ler e até entender qualquer expressão diferente da minha que nada me abalará . Compreender o Livre arbítrio também é permitir que cada um entenda a religiosidade como melhor lhe convier. Zelar das coisas sagradas depende do modo que conversamos diante de uma discórdia.

É o que penso!

Mi – Cps, 04/04/11