Uma das ciências humanas recentes que nos ajuda a ver o mundo e determinadas realidades, porém a primeira ciência social a se institucionalizar, antes mesmo da Ciência Política e da Antropologia.
O que estuda?
- Formação da sociedade ou pessoas que compartilham propósitos, gostos, preocupações, costumes que interagem entre si constituindo uma comunidade;
- Comportamento humano, reações de um sistema dinâmico próprias do meio onde está inserido, em função dos processos que interligam os indivíduos em associações, grupos e instituições (indivíduo na singularidade é estudado pela psicologia).
- Fenômenos sociais, analisa o homem em suas relações de interdependência, a compreender a cultura, as diferenças, o convívio desde relações famíliar, organização das empresas, política e religião.
O Estado se interessa e financia a pesquisa nas diversas áreas do saber; para constituir nas pessoas compreensão do cotidiano e de si mesmas como seres sociais. Espanta saber que o mundo hoje muito mais integrado e pessoas crescentemente dispersas. Sociólogos querem entender o que unia os grupos sociais e desenvolver um "antídoto" para a desintegração.
Estatísticas falam de padrões nas divergência, ou desarranjos das raça, etnicidade, classe, gênero, família, crime, divórcio e relações interpessoais.
Florestan Fernandes abre horizontes para a reflexão teórica e a interpretação da realidade social com uma nova interpretação e um novo estilo de pensar o passado e o presente.
Revela a formação, os desenvolvimentos, as lutas e as perspectivas do povo brasileiro, formado por indígenas, portugueses, africanos, árabes e asiáticos. História baseada no escambo, escravidão, colonialismo e imperialismo, na urbanização e industrialização, por meio da qual se dá a formação da sociedade de castas e posteriormente, da sociedade de classes, lutas sociais, desde as revoltas de comunidades indígenas contra os colonizadores e lutas contra o regime de trabalho escravo.
No século xx, desenvolve-se com as lutas de trabalhadores do campo e da cidade a conquista de direitos e estruturas sociais. Contribuição encontrada nos livros: A organização social dos Tupinambá, A integração do negro na sociedade de classes, O negro no mundo dos brancos, Mudanças sociais no Brasil e A revolução burguesa no Brasil.
Obra fundamental nas correntes de pensamento, além do balanço crítico de diferentes contribuições teóricas com novas possibilidades de reflexão desenvolvida em seus escritos, dentre os quais sobressaem: Fundamentos empíricos da explicação sociológica, Ensaios de sociologia geral e aplicada e A natureza sociológica.
Uma parte importante concentra-se na pesquisa e interpretação das condições e possibilidades das transformações sociais, como desafio teórico ou como perspectiva prática. Alguns livros relacionados com esse tema: A sociologia numa era de revolução social, A revolução burguesa no Brasil, Da guerrilha ao socialismo: a revolução cubana.
Entram também problemas relativos à educação popular e às responsabilidades nas interpretações prevalecentes presente no problema indígena, escravatura e abolição, educação e sociedade, folclore e cultura, revolução burguesa, revolução socialista e outros temas da história brasileira e latino-americana.
O homem se constitui como ser social no mesmo processo por meio do qual se constitui a sociabilidade. Assim, as partes e o todo constituem-se reciprocamente, modificam-se no mesmo processo em que se formam. "Da mesma maneira que a sociedade produz ela própria o homem como homem, ela é produzida por ele" (Marx). Ou seja, "sociedade e indivíduos não denotam fenômenos separáveis, mas são simplesmente os aspectos coletivos e distributivo da mesma coisa" (Cooley).
As disparidades, desigualdades e contradições colocam-se, desde o começo, como momentos nucleares das relações, processos e estruturas de dominação política e apropriação econômica que produzem e reproduzem a sociabilidade burguesa. Assim se resgata a historicidade do social, que aparece de forma desenvolvida na revolução. Naturalmente essa ampla problemática envolve sempre um diálogo com os clássicos e modernos, inclusive do pensamento marxista.
As três matrizes clássicas do pensamento sociológico: o método funcionalista, sistematizado por Durkheim; o compreensivo, formulado por Weber; e o dialético, criado por Marx. Elas sintetizam e estabelecem os paradigmas ou estilos de pensar a realidade social, que exercem influência marcante em todo pensamento sociológico no século XX. Cada método lida de forma peculiar quanto à relação do real com o pensado e vice-versa.
A sociologia é uma forma de apropriação e constituição gerada por dissolução da comunidade, emergência da sociedade burguesa, dinâmica de uma sociedade fundada nas desigualdades social, econômica, política e cultural.
SOCIOLOGIA CLÁSSICA E MODERNA.
O diálogo com os principais sociólogos ou cientistas sociais provocou a interpretação da realidade social que se encontram no horizonte intelectual de Florestan Fernandes, pelas sugestões, desafios, temas, teorias e controvérsias dos:
- franceses: Comte, Durkheim, Lê Play, Simiand, Mauss, Gurvitch e Bastide
- alemães: Weber, Sombart, Simmel, Tönnies, Freyer
- austríaco Wiese
- ingleses: Spencer, Hobhouse, Radcliffe-Brown,
- italiano Pareto
- estadunidenses: Ginsberg, Cooley, Giddings, Park(brasilianista), Burgess, Parsons, Merton e Wright Mills
- húngaro Mannheim (sobressai dentre todos)
- polones Maliniwski
Segundo o pensamento marxista contínuo amplo e crescente no diálogo desde a tradução de Contribuição à crítica da economia política e a "Introdução"(1946) das obras de Marx, Engels, Lenin, Trotsky e Gramsci presente nas reflexões dos problemas sociológicos. Momento importante do debate com Merton (1953), sobre o funcionalismo inspirado na segunda tese de Marx sobre Feuerbach: "A questão de saber se ao pensamento humano cabe verdade objetiva não é uma questão de teoria, mas uma questão prática".
O pensamento dialético na escolha dos temas e no tratamento gera crítica, mas a reflexão sociológica abre horizontes e desafios nos movimentos sociais e políticos comprometidos com as lutas e classes populares desenvolvidos por Florestan Fernandes sobre a forma da revolução burguesa e a continuidade da contra-revolução burguesa. "Trata-se de converter a teoria em força cultural e política (ou em força real), fazendo-se com que ela opere a partir de dentro e através de ações concretas de grupos, classes sociais ou conglomerados de classes".
Em diferentes escritos e momentos, o diálogo explícito ou implícito com Euclides da Cunha, Lima Barreto, Manuel Bonfim, Astrogildo Pereira, Graciliano Ramos, Caio Prado Júnior e outros cientistas sociais que compõem a família intelectual para desafiar as lutas em diversos setores populares. Recuperam algumas condições de existência (vida e trabalho), do índio, caboclo, escravo, colono, seringueiro, peão, camarada, sitiante, operário e outros pretéritos e presentes.
Anos 40, a sociedade cria recria urbaniza industrializa e migra, movimentos sociais, políticos, governamentais, regimes, influências externas, Imprensa, Igreja, todos são levados a pensar e repensar sobre o jogo das forças sociais, revolução e contra-revolução. O agrário agora é industrial sem perder o jeito rural. Mudança contínua no cenário da história imperial, conciliação de partidos, intelectuais, grupos e classes dominantes, militares e eclesiais. Década intelectualmente consolidada quando se pensa em universidade;
Anos 50, década de auto-afirmação do conflito irremediável. Acontecimentos sociais, políticos, econômicos, culturais e outros levam o intelectual a rever sua sociedade e desmistificar a história. "Inclusive, foi possível levar o desmascaramento mais longe e constatar-se que a revolução de 30 foi uma revolução elitista, com ressonância popular, que o chamado 'populismo' foi antes uma manipulação demagógica do poder burguês do que uma autêntica abertura para as 'pressões de baixo para cima"‘.
A maioria do povo é compreendido pelos grupos e classes sociais, o panorama social e histórico sai do pensamento produzido pelas perspectivas dos dominantes. Negro/trabalhador braçal/índio/imigrante/colono/camarada/peão e outros (lavoura/indústria/) são “livres”. A presença do negro na historia social brasileira desvenda o ponto de vista crítico na sociologia, ciências sociais e de outras esferas do pensamento. Fontes principais embora breves da sociologia crítica fundada por Florestan Fernandes acrescentando outras inspirações, como: a militância política, a reflexão sobre ética e política, o convívio com o pensamento latino-americano de José Martí, José Carlos Mariátegui, Ernesto Che Guevara e assim por diante.
Estilo de pensar a realidade social a partir da raiz ultrapassando a timidez metodológica e teórica ingressando em uma etapa em que todas as implicações do sistema são assumidas no cotidiano de ensino e pesquisa abrindo horizontes da reflexão sobre a sociedade e a história. Assim torna possível re-voltar às raízes pretéritas e presentes para descortinar o futuro.
Octávio Ianni, sociólogo, é professor do Departamento de Sociologia do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade de Campinas (Unicamp).
Palestra feita pelo autor no Ato Presença de Florestan Fernandes, organizado pelo Instituto de Estudos Avançados na Sala do Conselho Universitário da USP em 5 de outubro de 1995.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40141996000100006