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sábado, 8 de maio de 2010

Jürgen Moltmann

O teólogo amante da vida

De família protestante laica descobriu a fé em Cristo, lendo lamentação do AT, Salmo 39, e Marcos (narração da paixão) “Readquiri a coragem de viver, e lentamente, mas com segurança, tomou conta de mim uma grande experiência de ressurreição no “amplo espaço” de Deus”. Após a guerra nos três anos de internamento em campos prisionais: – “eu havia passado mais de cinco anos em casernas, campos, trincheiras e bunker, mas eu vivera algo que teria decidido sobre a minha vida – a teologia”.

● Seus docentes: Von Rad=AT/Bornkamm=os Evangelhos/Jeremias=o problema do Jesus histórico/Gogarten=exercitações de homilética (Moltmann o considera “cínico”)/Otto Weber=“Dogmática” de Karl Barth, o próprio Barth definia como “mapa de orientação e rebocador de transatlânticos”. - “eu pensava que após Barth já não pudesse existir outra teologia, porque ele dissera tudo e o fizera da melhor forma. Deste erro libertou-me o teólogo holandês Arnold van Ruler”.

● Moltmann e o amigo Pannenberg realizaram uma virada epocal no âmbito da teologia evangélica, introduzindo a teorética categoria de “reino de Deus”. -“Lentamente a minha carceragem interior, que eu escondera por trás do moto de Kierkegaard “desesperado e, contudo confiante”, se dissolveu e minha alma voltou a ser novamente ampla e jubilosa”.

● Após a láurea (prêmio) em teologia, vêm os anos do pastorado. - “Retornei à teologia contemporânea após a habilitação sobre a história da teologia reformada Levava em frente a “teologia do apostolado” e a teologia do êxodo e do reino de Deus”.... “...Conduziu-me pelos vestígios da esperança, voltada para frente, na escatologia do reino de Deus e de sua justiça sobre esta terra”.

● Seu ensinamento. - “Lancei-me sobre o “reino de Deus”, sem saber que este tema do futuro me manteria com a respiração suspensa por uma vida inteira”.

● Do filósofo Ernst Bloch lê “O princípio esperança” - “Bloch é, após séculos, o único filósofo alemão que cita a Bíblia em detalhe e com perícia, e que demonstra ser, ao seu modo, um bom teólogo da ”religião do êxodo e do reino”, como ele a chama”. A divergência entre o filósofo da esperança e o teólogo da esperança é formulada com muita precisão: - “Somente quando “a morte for tragada pela vitória”, o “princípio esperança” alcança o seu objetivo”.

● Obras de Moltmann:
- “Teologia da esperança” pertence à “história de uma vida” e à história da teologia do século vinte. - “era minha intenção restituir à cristandade sua esperança autêntica para o mundo. Assim, acolhi criticamente as esperanças num “mundo sem Deus”.
- “O Deus crucificado” teologia da cruz desenvolve o tema do sofrimento de Deus, que suscitou uma grande disputa: - “Mais importantes para mim são as dimensões de conforto oferecidas por esta teologia da cruz: “Somente o Deus sofredor pode ajudar”, escrevia Dietrich Bonhoeffer em sua cela de prisão, e com isso entendia o Cristo crucificado. “Sua cruz está entre as cruzes das vítimas da injustiça e da violência como sinal de que o próprio Deus participa da nossa dor e a torna parte de sua própria e compartilha da nossa preocupação”.
- Tese foi discutida criticada e definida “um pendor católico da reflexão de Moltmann”.
Na “A Igreja na força do Espírito”, terceira obra que conclui a fase da teologia da esperança e não tem a organicidade das duas grandes obras precedentes. O livro sobre a Igreja enfrenta uma série de temas e não só um tema central, como fazem Teologia da esperança e O Deus crucificado. Não faltam, no livro, reflexões e propostas inovadoras, como aquela, já avançada, que destina a celebração da Santa Ceia a todos e à qual são convidados os humildes e os opressores, enquanto o batismo deveria ser reservado aos crentes. A proposta suscitou uma dura crítica da parte católica (Kasper: reconstruo a disputa in “A teologia de Jürgen Moltmann”. Ora, Moltmann confessa: “Talvez, no entanto, esta proposta não era particularmente sábia”.
- Contribuições sistemáticas de teologia, que não se apresentam como uma “teologia sistemática”, e sim uma teologia dialógica e processual, mas que não renuncia a “propostas próprias” como “teologia a caminho pelas estradas do mundo e no tempo”. Este modo de fazer teologia “em termos de desafios e de realizações” “novo pensamento trinitário”.
Neste itinerário despontam duas obras, “Deus na criação”, onde desenvolve uma teologia ecológica da criação; e “O espírito da vida”, onde desenvolve uma pneumatologia integral, da qual brotaram um novo amor pela vida, uma cultura da vida e, não por último, uma nova espiritualidade dos sentidos, do corpo e da terra”.
Jürgen Moltmann parte de uma teologia da esperança para dilatar-se numa teologia da vida que encontra expressão também na prece, com a qual se conclui a Autobiografia, que, no título do livro, se inspira no Salmo 31,9: “Guiaste os meus passos no vasto espaço”.
Pergunta-se o teólogo: “O que amo quando amo Deus? Uma tarde, li nas Confissões de Agostinho, livro X 6, 8: “Mas, o que amo quando te amo? Não a beleza de um corpo, nem a atração da vida, nem o esplendor da luz, amiga destes meus olhos, não as doces melodias de uma infinita variedade de cantos, nem o suave odor de flores, ungüentos e aromas; não o maná e o mel, nem os membros gratos aos amplexos da carne; não é isto que amo quando amo o meu Deus. Existe, no entanto, certa luz e certa voz, certo perfume e certo alimento e certo amplexo que amo quando amo o meu Deus: a luz, a voz, o perfume, o alimento, o amplexo do homem interior que está em mim, onde minha alma é inundada pela luz que o espaço não contém, onde há uma música que o tempo não segura, onde há um perfume que o vento não dispersa, onde há um sabor que a voracidade não extingue, onde há uma união que a saciedade não alenta. É isto que eu amo quando amo o meu Deus”.
E naquela noite lhe respondi:
Quando amo Deus, amo a beleza dos corpos, o ritmo dos movimentos, o esplendor dos olhos, os abraços, os sentimentos, os perfumes, os tons desta colorida criação. Tudo eu gostaria de abraçar, quando te amo, meu Deus, porque te amo com todos os meus sentidos nas criaturas do teu amor. Tu me atendes em todas as coisas que eu encontro. Por longo tempo te procurei dentro de mim, me escondi na concha de minha alma e me defendi com a couraça da não aproximação; mas, tu estavas fora de mim e me atraíste pela estreiteza do meu coração no amplo espaço do amor pela vida. Assim saí de mim mesmo, encontrei minha alma nos meus sentidos e descobri aquilo que mais me pertence nos outros. A experiência de Deus aprofunda a experiência da vida e não a reduz, porque desperta a força de dizer incondicionadamente sim à vida. Quanto mais amo Deus, mais estou feliz de existir; mais existo plena e diretamente, mais percebo o Deus vivo, a fonte inexaurível da vida e a vitalidade eterna”.

● Análise escatológica existencial:
-Teologia da Esperança há um ataque devastador aos teólogos existencialistas da linha de Bultmann.
-Teologia futurista. A idéia de que Deus está sujeito ao processo temporal (Deus não é plenamente Deus) é parte do tempo que avança para o futuro. No tradicional, Deus e Jesus Cristo aparecem fora do tempo, no atempo. Na teologia de Moltmann, a eternidade se perde no tempo, o futuro é a natureza essencial de Deus e Ele não revela quem é, e sim quem Ele será no futuro. Desta forma, Deus está presente apenas em Suas promessas, na esperança. Todas as afirmações que fazemos sobre Deus, são produto da esperança. Para Moltmann Deus será Deus quando cumprir suas promessas e estabelecer o Seu reino, Deus não é absoluto; ele está determinado pelo futuro.
-Teologia cristã modela-se através da escatologia que não significa a previsão tradicional da segunda vinda de Jesus. É aberta ao futuro, à liberdade do futuro. Deus entrou no tempo, e consequentemente o futuro se tornou algo desconhecido tanto para o homem como para Deus.
- O cristianismo evangélico é a ressurreição de Cristo com a escatologia. O Cristo ressuscitado é “as primícias” da ressurreição (1Coríntios 15.23; At 4.2). A morte e ressurreição de Cristo são a garantia que Deus dá de que haverá ressurreição futura, e por isso, o começo da ressurreição final. A ressurreição de Cristo é um fato histórico que atribui pleno significado ao nosso futuro. Para Moltmann, a questão da historicidade da ressurreição corporal de Jesus não é válida. Jesus ressuscitou dentre os mortos há quase dois mil anos com seu corpo físico? Para Moltmann essa é uma questão sem importância. Não devemos olhar desde o Calvário para a Nova Jerusalém, e sim olhar o nosso futuro ilimitado para o Calvário. Afirma-se tradicionalmente que a ressurreição de Cristo é a base histórica da ressurreição final. Moltmann porém diria que a ressurreição final é a base da ressurreição de Jesus.
Ainda quanto ao futuro, Moltmann diz que o homem não deve olhá-lo passivamente; ele deve participar ativamente na sociedade. A tarefa da igreja é não é apenas se informar sobre o passado para mudar o futuro. É também “pregar o Evangelho de tal forma que o futuro se apodere do indivíduo e lhe impulsione a agir de modo concreto para mudar o seu próprio futuro. O presente em si mesmo não é importante. O importante é que o futuro se apodere da pessoa no presente”.
Para que o futuro se realize na sociedade, as categorias do passado devem ser descartadas, pois não existem formas ou categorias fixas no mundo. O futuro significa liberdade e liberdade é relatividade.
O principal propósito da igreja é ser o instrumento por meio do qual Deus trará a “reconciliação universal e social”. A participação da igreja na sociedade poderá utilizar a revolução como meio apropriado, mesmo que ela não seja necessariamente o único meio. Neste avançar para o futuro, o problema da violência versus não-violência recebe o nome de “problema ilusório”. A questão não é a violência em si, e sim se o uso da violência foi justificado ou injustificado. Essa tendência pragmática em que os fins justificam os meios é uma tendência muito forte dentro da Teologia da Esperança.
Assim como na “Teologia Secular”, aqui também pode ser vista uma profunda consciência para com o mundo. A idéia de Moltmann de considerar a Bíblia desde o começo como um livro escatológico pode parecer um atrativo para o cristão ortodoxo. Realmente um assunto tão importante quanto a escatologia não deveria ocupar as últimas páginas em nossos livros de teologia sistemática. Porém, qualquer conservador certamente saberá reconhecer os erros patentes de Moltmann, bem como os horrores que traria a sua visão ética.
Objeções à Teologia da Esperança.
Moltmann critica muitos conceitos neo-ortodoxos, mas ele acaba levando os conceitos barthianos muito mais longe. Barth havia transcedentalisado a escatologia por meio do emprego da distinção entre Historie e Geschichte, mas Moltmann foi ainda mais além, e rejeitou todo o conceito objetivo da história. Se por um lado a dialética de Barth acabou com a possibilidade da relação entre história e fé, a teologia de Moltmann destruiu até mesmo a possibilidade de haver história.
Ainda que Moltmann revista sua escatologia de conceitos bíblicos, seu sistema está mais fundamentado no marxismo do que em Cristo. O primeiro livro de Moltmann, “Teologia da Esperança” nasceu de um dialogo com o ateu alemão Ernst Bloch, e quando lemos o seu segundo livro, vemos que nesse intercâmbio, Moltmann assimilou muitas idéias de Bloch.
A idéia que Moltmann tem da escatologia é destituída de base bíblica. Apesar de todo esforço de Moltmann para produzir uma teologia bíblica, no final, seu sistema nada mais é do que uma teologia centralizada no homem, em um homem que observa o futuro e age na sociedade. A meta do futuro de Moltmann não é a plena manifestação da glória de Cristo; ela é a edificação da utopia na terra. Para ele, o Reino de Deus se introduz na terra por meio da política e da revolução. Para o apóstolo Paulo, no entanto, o Reino de Deus é, e será introduzido por meio da proclamação do poder salvador de Jesus Cristo (Atos 28.30-31). Para Moltmann, esse reino é também uma realidade terrenal e tangível; o Reino de Deus, no entanto, é descrito na Bíblia como celestial. Para Moltmann, o Reino de Deus é trazido por meio da revolução; no entanto, segundo a Bíblia, o Reino de Deus traz a paz, e não a guerra (Romanos 14.7).
Quanto ao conceito de Deus, ele não admitia nenhum Deus eterno ou infinito. Ao entrar no tempo, segundo ele, Deus se tornou finito e aberto a um futuro desconhecido. O Deus da Bíblia existe de eternidade a eternidade; o de Moltmann, porém, só existe no futuro, pois no presente ele sequer é Deus. Como observou certo escritor: “No monte sinai, Deus disse a Moisés: Eu sou o que sou, mas Moltmann não permitua que Deus lhe dissesse o mesmo.
A teologia de Moltmann tem maior dívida com Nietzche, com Overback e com Feurbach do que com Paulo, Pedro ou João. Ela é mais marxista que bíblica, e mais filosófica que teológica. Em seu afã de refutar as teologias não-ortoxas do seu tempo, Moltmann ultrapassou o limite do bom senso e acabou por propor uma teologia quase tão nociva quanto aquela a que ele se dedicou a refutar. Essa teologia do Deus finito e temporal, e que ainda incita a rebeldia e a revolução, não pode ser teologia bíblica. Ela é antes, um tropeço, um escândalo e uma nociva ameaça à sã doutrina.
Fonte: http://teologiacontemporanea.wordpress.com/2009/10/07/teologia-da-esperanca-jurgen-moltmann-e-a-analise-escatologica-existencial/